Resta ver agora
quais devem ser os modos e o proceder de um príncipe para com os súditos e os
amigos {...}Em verdade, há tantas diferenças de como se vive, que aquele que
abandone o que se faz por aquilo que se deveria fazer, aprenderá antes o
caminho de sua ruína do que o de sua preservação, que um homem que queira em
todas as suas palavras fazer profissão de bondade, perder-se-á em meio a tantos
que não são bons. Donde é necessário, a um príncipe que queira se manter,
aprender a poder não ser bom e usar ou da bondade, segundo a necessidade.
Nasce daí uma
questão: se é melhor ser amado que temido ou o contrário. A resposta é de que
seria necessário ser uma coisa e outra; mas como é difícil reuni-las, em tendo
que faltar uma das duas é muito mais seguro ser temido do que amado. Isso
porque os homens pode-se dizer, geralmente, que são ingratos, volúveis,
simuladores, tementes do perigo, ambiciosos de ganho; e, enquanto lhes fizeres
bens, a vida, os filhos, desde que como se disse acima, a necessidade esteja
longe de ti; quando esta se avizinha, porém,revoltam-se. E o príncipe que
confiou inteiramente em suas palavras encontrando-se destituídos de outros
meios de defesa, está perdido: as amizades que se adquirem por dinheiro, e no
momento oportuno, não se torna possível utilizá-las. E os homens tem menos
escrúpulos em ofender alguém que se faça amar do que a quem se faça temer,
posto que a amizade é mantida por um vínculo de obrigação que, por serem os homens
maus, é quebrado em cada oportunidade que a eles convenha; mas o temor é
mantido pelo receio de castigo que jamais se abandona.
Deve o príncipe,
não obstante, fazer-se temer de forma que, se não conquistar o amor, fuja ao
ódio mesmo porque pode muito bem coexistir o ser temido e o não ser odiado: isso
conseguirá sempre que se abstenha de tomar os bens e as mulheres de seus
cidadãos e de seus súditos e, em se lhe tornando necessário derramar o sangue
de alguém, faça-o quando existir conveniente justificativa e causa manifesta.
Deve, sobretudo, abster-se dos bens alheios, posto que os homens esquecem mais
rapidamente a morte do pai do que a perda do patrimônio.
(...) Quando seja
louvável em um príncipe o manter a fé da
palavra dada ) e viver com integridade, e não com astúcia, todos compreendem,
contudo, vê-se nos nossos tempos, pela experiência, alguns príncipes terem
realizado grandes coisas a despeito de terem tido em pouca conta a fé da
palavra dada, sabendo pela astúcia transtornar a inteligência dos homens; no
final, conseguiram superar aqueles que se firmaram sobre a lealdade.
Deveis sabe, então,
que existem dois modos de combate: um com as leis, o outro com a força. O
primeiro é próprio do homem, o segundo, dos animais; mas, como o primeiro modo
muitas vezes não é suficiente, convém recorrer ao segundo.
(...) Necessitando
um príncipe, pois, saber bem empregar o animal, deve deste tomar como modelos a
raposa e o leão, eis que este não se defende dos laços e aquela não tem defesa
contra os lobos. Aqueles que agem apenas como o leão, não conhecem a sua arte.
Logo, um senhor prudente não pode nem deve guardar sua palavra, quando isso
seja prejudicial aos seus interesses e quando desapareceram as causas que o
levaram a empenhá-la. Se todos os homens fossem bons, este preceito seria mau;
mas, porque são maus e não observariam a sua fé a teu respeito, não há razão
para que a cumpras para com eles.
{...} Maquiavel,
Nicolau O
Principe.
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