TRADIÇÃO
E ORALIDADE DAS COMUNIDADES RURAIS DE
VIZEU PARÁ
Prof. Gaspar/Historiador, Universidade Federal do Pará
Em virtude de ser professor e administrar aula nas
comunidades rurais do Pará me chamou atenção de moradores das comunidades tradicionais
do município de Vizeu Pará, a forma como se expressão a relatar histórias que
pra eles são reais e falam com tanta firmeza e se espalham ao longo de suas
origens, pois passam de pai para filho a forma como contam e como se vivessem o real e não o imaginário como nos
pensamos.
A organização textual
da literatura oral compartilhada por mim, foi o ponto de partida desta
pesquisa. Narrando o acervo da tradição oral compartilhado, os moradores
falavam da experiência de valorização e da importância de se conservar essa
tradição oral. No percurso de organização do acervo oral busquei apreender a
elaborar e transmitir a experiência individual e coletiva, diante da narração
de histórias, contos e casos tradicionais pelos moradores da comunidade. As entrevistas
foram realizadas em roda de conversa, a
experiência dos moradores tornam-se mais acessíveis. Foram entrevistados
aqueles conhecidos como grandes conhecedores da literatura oral da comunidade,
e utilizou-se o método fenomenológico para a análise dessas experiências. Os
resultados apontam a preocupação dos moradores em guardar esta literatura oral
de forma textualizada, uma vez que ela encontra-se espalhada na memória dos
moradores das comunidade de Vizeu Pará. Ao resgatar este acervo oral e guardá-lo
textualmente, eles pretendem, também, valorizar a memória dos antepassados, e
guardá-la para as gerações futuras. Para contar a sua história de vida, cada
morador se remete à memória coletiva compartilhada pela comunidade. Vê-se,
portanto, uma interseção entre história pessoal e comunitária, apoiadas o
fortemente no passado. Concluiu-se que este acervo oral acumulado em anos de
história é constantemente reelaborado pelos moradores, permitindo a cada um
deles construir a sua própria história, que é também coletiva, e que pretendem
preservar para as novas gerações.
HISTÓTRIAS CONTADAS
No Pará, principalmente em cidades do interior, as lendas têm
uma grande influência sobre o povo, que acredita na veracidade de suas
histórias. Basta um instante conversando com algum morador mais antigo para ser
envolvido em uma aura mística, os próprios alunos são envolvidos pelas
histórias de sua região, pois seus pais avós que nasceram nos locais e os
primeiros a povoar as comunidades contam com veemência, apesar da energia elétrica
ter chegado na região ainda há aquela escuridão que envolve as ruas as sombras
da noite é o modelo ideal para relatar contos que os conhecedores do
conhecimento oral tem pra relatar suas histórias. E ao sentar em frente de suas
casas que roda de conversas vai de noite a dentro iluminado pelo lua cheia que
histórias como: de mula sem cabeça, vela que anda sozinha, o homem que vira
porco, a matinta que ao voar de noite deu vou errado e amanheceu a mulher
encima da folha do coqueiro, do menino pretinho que pula com uma só perna, a
mapinguarí que tem um só olho no meio da testa, todos esses contos contados e
cantados em prosa e verso e quando se tem um violão artesanal se torna mais fantástico, animador e tenso, tenso
pois se sente o personagem cantado e contado perto da roda de conversa,
fantasia misturada a realidade, com aspectos místicos e um pé no sobrenatural,
as lendas nascem, crescem e se reproduzem mas, de fato, nunca morrem.
Sobrevivem na memória das pessoas e povoam nossa imaginação com fatos irreais,
sem comprovações científicas ou verdades absolutas, como “quem conta um conto,
aumenta um ponto”, são repassadas de gerações a gerações e se mantêm vivas no
imaginário de um povo. Os contadores de histórias, são geralmente pessoas mais
velhas, líder de comunidade ou chefes de famílias, geralmente ficam
encarregados de alguma missão dentro do grupo, ressalta-se que os mais jovens
ficam atentos ao saber transmitidos, geralmente não fazem perguntas só
assimilam ensinamentos.
O conteúdo das lendas é fortemente simbólico e geralmente tem
detalhes que podem ter realmente acontecido ou não, e que ao serem contados e
recontados começam a ter um outro nível de realidade e imaginação.
Na antiguidade, não
conseguindo explicar os fenômenos da natureza de forma científica, os povos
criavam mitos para dar um sentido maior aos acontecimentos inexplicáveis. Tal
qual os mitos, extraídos de lendas gregas, acabam sendo explicados à luz da
psicologia moderna. No Brasil, a miscigenação contribuiu fortemente para a origem
de um grande número de lendas que, vindas de outros povos, acabaram fazendo
parte da nossa própria história.
As lendas, em especial as amazônicas, são muito famosas e
vagam pelos quatro cantos do país. As mais difundidas, de origens indígenas,
costumam buscar explicações para os elementos da natureza. Em maior ou menor
grau, estão presentes em nosso cotidiano e acabam influenciando a formação
cultural de cada região ao se misturar a cultura africana trazida pelos negros
ao longo dos séculos, onde muda todo um cenário cultural imposto pelo cultura
européia.Com intuito de embranquecer os modos, os costumes e até a religiosidade com histórias contadas e lendas
de heróis porque não dizer gregas, que as tradições culturais e orais afro
foram sufocadas até os dias de hoje, por esta razão que historiadores e
pesquisadores ajudaram a se fazer implantar a Lei 10.639/03 que dá suporte de
manter viva as tradições culturais africanas em nosso país contra toda uma
imposição branca que vai de encontro ao racismo, preconceito e a intolerância
religiosa. Essa lei 10.639/03 e suas diretrizes precisam ser compreendidas
dentro do complexo campo das relações raciais brasileiras sobre o qual incidem.
Isso significa ir além da adoção de programas e projetos específicos voltados
para a diversidade étnico-racial realizados de forma aleatória e descontínua.
O QUE É TRADIÇÃO ORAL ?
OU CONHECIMENTO ORAL
Não há como falar de ensinamentos orais sem relembrar a
figura do Griô africano, Pacheco (2006, p. 45) lembra que: “Na tradição oral, a
palavra griô tem um poder e um significado divino, tem um compromisso com a
verdade e com os ancestrais”, Hampâté (apud PACHECO, 2006, p. 8) diz que: Uma
vez que a sociedade africana está fundamentalmente baseada no dialogo entre os
indivíduos e na comunicação entre comunidades ou grupos étnicos, os griots são
os agentes ativos e naturais nessas conversações, Pacheco (2006, p. 16) ainda
afirma: “O griô é um educador caminhante alegre e afetivo, sábio na criação de
rituais de vinculo e aprendizagem, histórias e artes de viver”.
A palavra griô vem de griot, em francês. A palavra tem sua
origem em bamanan, língua do noroeste da África, antigo império do Mali, e
significa “o sangue que circula”. Assim como o significado da palavra, são
reconhecidos como griôs aqueles que fazem com que as tradições circulem entre
as novas gerações, preservando a identidade cultural de cada povo.
Na falta de griôs pelo
Brasil, cabe aos mestres das tradições e aos mais antigos o ensinamento das
mesmas para os jovens, assim diz o provérbio iorubano: “Quando morre um velho é
como se uma biblioteca inteira fosse incendiada (Hampâté Ba), os velhos são
guardiões das tradições” (SOUZA; LIMA, 2006, p. 95). De acordo com Abib (2005,
p. 95): O mestre é aquele que é reconhecido por sua comunidade, como o detentor
de um saber que encarna as lutas e sofrimentos, alegrias e celebrações,
derrotas e vitórias, orgulho e heroísmo das gerações passadas, e tem a missão
quase religiosa, de disponibilizar esse saber àqueles que a eles recorrem.
A “tradição oral” é transmitida oralmente de uma geração para
outra. Suas características particulares são o verbalismo e sua maneira de
transmissão, na qual difere das fontes escritas. Devido á sua complexidade, não
é fácil encontrar uma definição para a tradição oral que dê conta de todos os
seus aspectos, testemunhos orais podem ser transmitidas em discurso e podem
tomar a forma, por exemplo, de contos, provérbios, baladas, canções. Desta
forma, é possível que uma sociedade possa transmitir a história oral, e outros
saberes entre as gerações, sem um sistema de escrita, para alguns estudiosos, o
problema todo se resume em saber se é possível conceder á oralidade a mesma
confiança que se concede a escrita quando se trata do testemunho de fatos
passados. No meu entender, não é esta a maneira correta de se colocar o
problema. O testemunho seja escrito ou oral, no fim não é mais que testemunho
humano, e vale o que vale o homem. Não faz a oralidade nascer a escrita, tanto
no decorrer dos séculos como no próprio individuo ? Os primeiros arquivos ou
bibliotecas do mundo foram o cérebro dos homens. Antes de colocar seus
pensamentos no papel, o escritor ou o estudioso mantém um diálogo secreto
consigo mesmo. Antes de escrever um relato, o homem recorda os fatos tal como
lhe foram narrados ou, no caso de experiência própria, tal como tal como ele
mesmo narra. A tradição oral é a grande escala da vida, e dela recupera e relaciona todos os aspectos. Pode parecer
caótica aqueles que não lhe descortinam o segredo e desconcertar a mentalidade cartesiana acostumada a separar
tudo em categorias bem definidas. Dentro da tradição oral, na verdade, o
espiritual e o material não estão dissociados.
O QUE É UMA IDENTIDADE
AFRO-BRASILEIRA?
Segundo a teoria da
descentração proposta por Hall (1999), o sujeito moderno desenvolve várias
identidades, mas eu diria que a predominante devido o processo de globalização
e interesse das elites capitalistas, seria a cultura dos povos dominantes
imposta sem controle aos outros povos, com a qual os dominados em sua maioria
se identificam, segundo Abib (2005, p. 35): As identidades dos sujeitos,
imersos nesse processo de globalização, passam por profundas transformações,
perdendo a estabilidade que outrora se entendia como sendo sua marca. As pessoas
valorizam ao extremo essa cultura que é mais uma do povo brasileiro, mas não a
única, já que segundo Darcy Ribeiro (1995) é um novo povo, surgido de um misto
de portugueses, africanos e índios. Mas o que vimos na realidade é, haver
somente uma única cultura branca passando por cima das demais.
Foi pensando nestas problemáticas que foram criadas as Leis
10.639/03 (cultura negra) e 11.645 (cultura negra e indígena) que torna
obrigatório o ensino da História e Cultura Afro-brasileira e Indígena, para
garantir na educação a presença das outras culturas. Essa mesma tentativa de se
impor uma única cultura criou as chamadas resistências, segundo Abib (2005, p.
10): Não há como desconsiderar na atualidade, o processo de fortalecimento de
tradições e práticas culturais de determinados grupos sociais, que trás como
conseqüência, um profundo sentido de pertencimento por parte do sujeito, com
relação ao grupo social do qual é originário. São núcleos que se espalham cada
vez mais pelo país com movimentos de valorização das outras raízes brasileiras
que não somente a europeia, e é ai que entram os povos remanescentes da África,
ou melhor dizendo afrodescendentes, que mantêm vivo os costumes, tradições e
ensinamentos/conhecimentos africanos aqui no Brasil, através da oralidade uma
pedagogia típica desse povo. A identificação com essa cultura, a vivência nela
e a luta para mantê-la viva, séria em minha opinião a essência da identidade
afro-brasileira. Tradição oral A tradição oral é a fonte primordial da
história. A palavra oral, a fala, foi sempre muito mais importante para os
africanos do que a escrita, que não passa de uma memória artificial, opinião
também compartilha por Reyzábal quando afirma: A tradição oral nos encaminha
para nossas raízes e permite sermos partícipes da existência em coletividade
[...] A escrita fixa no papel, a oralidade fixa na memória [...] Nesse sentido,
tradição e literatura orais não só representam o produto da imaginação e
fantasia, mas também permitem a integração do individuo na cultura criada pela
coletividade. (REYZÁBAL, 1999, p. 259-261) É através da memória, da fala, que a
História da África tem sido contada e passada entre os africanos ao longo das
gerações. A cultura africana é predominantemente oral, as histórias contadas e
recontadas constituem a forma mais eficaz de perpetuar a tradição e os
costumes. É justamente esse fortalecimento de identidade pela oralidade que
proponho nesse artigo.
“As tradições orais são todos os testemunhos orais, narrados,
relacionados ao passado”, já para Gonçalves e Silva (2003, p. 185): A tradição
oral é uma manifestação da tradição cultural, e, como ela, encerra conjunto de
significados, que se apresentam com continuidade e constância entre membros de
um mesmo grupo étnico-racial. Encontram-se tais significados inscritos em
intenções, projetos, posicionamentos, avaliações, articulados no agir e
intervir no ambiente. Trata-se de patrimônio ancestral inatingível que
sobrevive, com renovados contornos, como que ocultado, mas sempre
compartilhado. Essa tradição não é um simples costume, é um conjunto de
ensinamentos para vida que raramente são passados para esses descendentes de
africanos, pobres em sua grande maioria. Esses conhecimentos quase nunca
atravessam as portas das escolas, onde se ensina a cultura dos povos
dominantes, e a sua própria cultura é vista com descaso e preconceito.
Por isso as Leis
10.639 e 11.645 devem ser postas em prática e não ficarem somente no papel como
várias outras, para que sejam adotados no ensino das escolas elementos identificadores
das culturas negra e indígena, contrariando a visão dominadora e vitoriosa
branca, para que os descendentes dessas culturas venham a ter seus próprios
heróis. A cultura africana propriamente dita, travou uma verdadeira luta por
esse povo, que só queria ser, estar, permanecer e existir com sua identidade.
Eles foram vítimas de perseguição por outras culturas, que desconheciam e ainda
desconhecem esses patrimônios brasileiros de saber. Esses saberes que segundo
Abib (2005, p. 98-99): São saberes e conhecimentos
que não podem ser disponibilizados a qualquer pessoa ou em qualquer momento,
mas necessitam, para ser transmitidos, de uma certa preparação por parte da
pessoa interessada, que inclui muitas vezes uma “iniciação” que faz parte da
ritualidade característica daquele grupo [...] Essas estratégias são
fundamentais para a continuidade dessas tradições, que não teriam chance de se
preservar ao longo do tempo, se fossem demasiadamente “abertas” às influencias
externas.
Fazem parte dos saberes africanos: os contos, fábulas e
lendas, instrumentos da tradição oral africana que incluem elementos da
natureza, espíritos e símbolos sobrenaturais e experiências vividas pelos
antepassados e contemporâneos, refletindo os aspectos relevantes da vida em
comunidade. A necessidade de narrá-los impõe-se, e a literatura tradicional é
fértil em possibilidades novas e criativas: histórias, contos, provérbios,
adivinhas, poemas. É a chamada tradição oral, existente em vários outros
movimentos e permanentemente atualizada em função da realidade quotidiana.
Dentro dessa fonte de saber não posso deixar de dar uma atenção maior aos
mitos, que são a base da pesquisa da mitologia africana.
Anterior à escrita, os mitos já existiam em sua expressão
oral transmitidos por grandes mestres de diferentes regiões do continente
africano, referenciando a tradição africana. E para esta representação, o mito
indica a síntese da origem do universo em diversas etnias por todo o mundo. Por
este motivo também, os mitos orais têm a palavra como força suprema. Se não há
confiança na palavra falada, como se pode ter confiança na palavra escrita? De
forma geral, na África tradicional, a palavra é sinal de divindade, até ter
contato com a materialidade, com a expressão escrita. Mas isso não a fez perder
a sacralidade. E é por isso, que existem nesta tradição pessoas específicas
para trabalharem com o discurso, tidas como sagradas. No exercício de educar
para a vida, o pensamento africano mantém como tradição as histórias míticas,
que podem ser consideradas como práticas educacionais que chamam a atenção para
princípios e valores que vão inserir a criança ou o jovem na história da
comunidade e na grande história da vida. No pensamento africano, a fala ganha
força, forma e sentido, força e orientação para a vida. A palavra é vida, é
ação, é jeito de aprender e de ensinar. Assim nasceram os mitos. Contar um
mito, em muitos lugares, faz parte do jeito de educar a criança que, mesmo
antes de ir para a escola, aprende as histórias da sua comunidade, os acontecimentos
passados, valorizando-os como novidade. (MACHADO, 2003) consegue-se transformar
essa realidade mostrando: a importância do convívio das crianças com um
ambiente de sua cultura para formação da identidade e personalidade; o ensino
dos mais velhos e o respeito a eles e às suas sabedorias; como usar os mitos
para passagem de conhecimento e para formar pessoas melhores; a importância do
subjetivo de mãos dadas ao conhecimento científico, dando ênfase à motivação, à
imaginação, costumes e valores da cultura afro-brasileira; preocupando-se
realmente com o desenvolvimento das crianças, e não apenas em formar
mão-de-obra; utilizando o conhecimento para favorecer a prática do cotidiano;
criando contato e respeito com a natureza e o meio ambiente. Para relacionar a
importância do mito para o nosso ser: Campbell (1990) revela a capacidade que
os mitos têm de dialogar com a sabedoria de vida, um diálogo que transcende a
literatura e as artes. Segundo ele o mito cria uma “ressonância do interior do
nosso ser e da nossa realidade mais íntimos, de modo que realmente sintamos o
enlevo de estar vivo”. Enquanto Souza e Lima (2006, p. 84) destacam a
importância desses mitos para vida: Assim, as histórias míticas podem trazer
muitos exemplos para vida cotidiana, incluindo lições sobre o mistério da
natureza humana. São histórias que, aprendidas, serviam e ainda servem para dar
continuidade à tradição, à cultura e aos sonhos de um determinado grupo de
indivíduos ou de uma sociedade. A oralidade como preparação para vida, e dentro
dela os mitos são conceitos que podem ser referenciados e trabalhados em sala
de aula e em todos os outros espaços, a fim de compreender uma das tradições
africanas mais relevantes e influenciadoras no processo de formação da
identidade brasileira. Exaltando um ser negro, que passará a se ver com
orgulho, e não mais se espelhar sempre nas elites dominantes. A narrativa
retrata a vida social de um povo, uma nação, ou até de um indivíduo e sua
história se transforma em instrumento mediador para a formação de novas
identidades e possivelmente, novas narrativas. Observamos o que nos diz também
os movimentos da capoeira e do candomblé como formas positivas de transmissão
desses saberes. Venho tentado mostrar a importância dessa oralidade para os
sujeitos afro-descendentes e para todas as outras etnias como uma lição de
vida, e como uma construção de identidades realmente ligadas às raízes e à
cultura de um povo e ainda fazemos isso às vezes e é muito gostoso.
Com certo cuidado, entramos em contato com alguns terreiros,
fomos visitar com intuito de resgatar histórias relacionadas à mitologia
africana. Precisaremos explorar esse campo com muito cuidado para não agredir a
religião, e ao mesmo tempo conseguir algum material, já que eles são muito
reservados quando se tratam dos saberes tradicionais passados pelos ancestrais.
O terreiro é um ambiente novo para mim, antes eu tinha medo e até preconceitos
em relação ao Candomblé, pois sou adepto do cristianismo mas depois que
adentrei aquele local e estudei mais sobre o assunto comecei a atender melhor a
religião. Espero que esses conhecimentos adquiridos se perpetuem através dessa
oralidade e resistência, para que as pessoas possam se identificar com suas
matrizes africanas e se sentirem pertencentes a elas, assim como venho me
identificando, quebrando preconceitos e me tornando uma pessoa entendida no
assunto.
SURGIMENTO DO NEGRO NA
AMAZÔNIA
As primeiras
referências sobre a introdução de escravos de origem africana na Amazônia datam
de 1662 e 1680, e foi no final desse
mesmo século XVII, que a coroa portuguesa decidiu introduzir escravos negros
através da companhia de comércio do maranhão. e mesmo que historiadores, como
Arthur Cézar Ferreira Reis, registrem entrada de escravos ainda entre o fim do
século XVI e inicio do século XIX, feito por ingleses, foram mesmo os
portugueses que os introduziram em grande número.
No período final do século XVII, parece que a presença negra em
engenhos e outras propriedades rurais e ribeirinhas ainda era escassa, mas em
Belém, ela já era marcante, tanto é que data de 1628 a fundação, na cidade, da
irmandade de nossa senhora do rosário dos homens pretos, e de 1693 a igreja de
nossa senhora do rosário, que eram tradicionais redutos de devoção dos negros,
talvez o fato de a companhia de comercio favorecer mais o maranhão com o
abastecimento de escravos, é que explique por que apenas nos arredores de
Belém, por essa época, se desenvolveu uma agricultura de produtos de
exportação, como cana-de-açucar, arroz, tabaco, algodão e cacau,mas foi com a
criação da companhia de comercio do Pará e do maranhão, em 1755, que houve um
grande aumento do fluxo de escravos para a Amazônia. Por 22 anos, foram cerca
de 12,587 escravos provenientes da África, sendo que parte deles acabou indo
para o Mato Grosso, esses escravos deveriam iniciar a substituição da
mão-de-obra indígena pela negra, e ao mesmo tempo contribuir para o
desenvolvimento da produção agrícola como certamente ocorreu com intensidade
nas regiões ás margens dos rios Guamá, Capim, Acará e Igarapé Mirim e outros.
CONCLUSÃO
Afirmei nesse artigo a necessidade de uma pedagogia voltada
para o fortalecimento de identidades de uma população que tem sido forçosamente
dominada culturalmente, que a meu entender parte de uma tradição oral
fortemente preservada, e que tem sido por interesse de classes dominantes
esquecida. Os estudos na literatura, exemplos nas matrizes africanas e as
atividades da pesquisa, mostraram ser de imprescindível importância desenvolver
essas convivências dentro de uma oralidade africana de resistência. A própria
dinâmica da transmissão oral exige a interação e a convivência sociável entre
as pessoas, agindo diretamente para que elas não sejam mais do que meros
instrumentos capitalistas, e possam libertar sua alma numa perspectiva de se
sentir humano, vivo, respeitado, pertencente a uma lógica maior do que está
sendo imposta a todos nós. Abordei, ainda, como a convivência na comunidade e
entre as pessoas, é importante para a educação acadêmica e para vida, usando a
mim mesmo como exemplo de transformação. Reconheço que ainda é preciso
aprofundar mais no campo das identidades e dos interesses políticos em questão.
Precisamos encarar nossa jornada com muito mais afinco no âmbito da mitologia africana, levando ao máximo de
pessoas possíveis a importância de valorizar o que é patrimônio delas e nosso
também, a nossa cultura e identidade. Por isso, é fundamental fomentar nos
jovens e educadores, o desejo de preservar as histórias particulares da
comunidade narrativa a que pertencem. Eles devem ser estimulados para que
tragam as histórias que conhecem, para que tenham orgulho delas e passem a
contá-las em todos os espaços possíveis.
Sem dúvida o nosso maior investimento para a continuidade
desse elo. E como educador temos que nos aprimorar cada vez mais, para dar
conta dessa gigantesca responsabilidade, de fazê-los enxergar o mundo por seus
próprios olhos e pelos olhos de seus ancestrais.
Prof. Gaspar/Historiador
Nenhum comentário:
Postar um comentário